Thursday, December 28, 2006

PROBLEMAS EXPERIMENTAIS PARA VALIDAÇÃO DE PERCEPÇÃO EXTRA-SENSORIAL

A proposta é um experimento simples. Entrevistador e entrevistado têm diante de si uma lista com um certo número de itens. Estes itens podem ser, digamos, uma lista de cores. O entrevistador então escolhe ao acaso uma das cores, concentra-se nela, ou mesmo imagina o entrevistado envolto por uma núvem da cor escolhida, e então este deverá dizer qual é a cor imaginada. Chamemos este de experimento do tipo I. Uma outra variante do experimento diz respeito a preencher inúmeros papéis, cada um com um nome distinto de uma cor, embaralhá-los e escolher então um ao acaso. O entrevistado deve dizer qual é a cor escrita no papel escolhido e então este é virado para comprovar a validade da adivinhação. Consideremos aqui que este é o experimento do tipo II.

A hipótese que está sendo testada aqui é a de que é possível a transmissão de informação diretamente de uma mente a outra, ou talvez de um espírito a outro (assumindo aqui também a hipótese de que esta informação não estaria contida apenas em um substrato material). Entretanto, segundo algumas das explicações propostas para o caso em que tal hipótese se mostrasse correta, a realização deste experimento torna-se extremamente complexa.

Uma destas explicações que mais procura estar de acordo com o estado atual da física diz respeito à problemática do colapso da função de onda. Em resumo, a física moderna não trata de cada partícula que compõe o mundo material como se esta fosse uma bolinha de bilhar. Ao invés disso, cada partícula é descrita por uma função que nos diz qual sua probabilidade de ser encontrada em determinada região do espaço. Assim, na mecânica quântica, não faz sentido nos perguntarmos se um elétron está na posição número cinco sobre um eixo orientado, por exemplo. Faz sentido apenas nos perguntarmos qual a probabilidade de que ele esteja entre as posições quatro e meio e cinco e meio, por exemplo. A cada observação, um fenômeno diferente será observado, obedecendo estas leis de probabilidade, mas a predição exata de um dado fenômeno específico torna-se uma impossibilidade.

A partir deste que é um fato consagrado da forma pela qual a mecânica quântica descreve o mundo atualmente, e passando por inúmeros exercícios de especulação, propõe-se que o pensamento, a mente humana ou a consciência humana, chamem como quiser, teria o poder de controlar o colapso de onda e afetar as escolhas aleatórias que a natureza faz ao construir o segundo seguinte.

Esta explicação é coerente com o experimento do tipo II, em que uma cor é escolhida ao acaso dentre os papéis porém não se observa qual é a cor realmente escolhida. Portanto, até que efetivamente o papel seja virado e a cor exposta aos observadores presentes, pode-se assumir que a função de onda que descreve todo o complexo conjunto físico dos papéis não esteja ainda colapsada e esteja, portanto, aberta a este suposto controle externo.

Já o experimento do tipo I não se relaciona diretamente a esta teoria pois, uma vez pensada uma cor pelo entrevistador, esta realidade física (uma informação criada e contida no cérebro do entrevistador) é imediatamente observada por ele próprio, em sua consciência. Assim, não há função de onda não colapsada nesta história. Ainda assim, é um experimento interessante pois, desde que a aleatoriedade nas escolhas das cores seja minimamente garantida, possibilitaria verificar a transmissão de informações sem um intermédio físico concreto.

Algumas dificuldades se impõe, entretanto, para a realização de um experimento que parece simples. Segundo a própria proposta (em especial no que diz respeito ao experimento II), as atividades mentais dos participantes tem o poder de influenciar o resultado final, como por meio do controle do colapso da função de onda. ora, isso significa que o observador não é mais um simples observador, ele é também parte das causas do fenômeno observado. Nestas condições, é plenamente possível argumentar em que um experimento tenha sido fadado ao insucesso precidamente porque ao menos um dos participantes não acreditava devidamente na possibilidade de êxito.

No caso do experimento I, a dificuldade viria de algum bloqueio que o entrevistador imporia às suas transmissões mentais ao entrevistado, a um possível desejo interior de que este errasse a maioria das respostas fazendo portanto com que informação errada, ou nenhuma informação, fosse transmitida no final das contas.

Exploremos as conseqüências dessas divagações. Em primeiro lugar, tem-se então que, ao olhar clássico da ciência, não temos nenhum experimento verdadeiramente merecedor deste título em curso aqui. Isso porque, para que algo possa ser considerado um experimento, ele deve se referir diretamente a alguma hipótese testável e diretamente relacionada aos seus resultados. Caso, porém, estes resultados dependam de condições incontroláveis no experimento, ou caso um mesmo resultado admita diferentes explicações (por exemplo, uma distribuição puramente estatística no resultado das adivinhações pode ser interpretada tanto como inexistência da transmissão telepática de informações como simples bloqueio mental oriundo do entrevistador ou mesmo incapacidade do entrevistado, não resolvendo o problema de decidir sobre a própria existência das transmissões telepáticas). Neste sentido, deve-se buscar imaginar que tipo de experimento seria capaz de dar conta destas limitações.

Em segundo lugar, abre-se o problema filosófico, que pode ter desdobramentos práticos na forma em que a mecânica quântica é conduzida em laboratório, de como a ciência deve armar seu arsenal experimental para os casos em que o observador, invariavelmente, tem participação no fenômeno.

A busca da relação direta com o mundo material parece ser sempre a saída mais segura. Supondo casos de 90% ou mesmo 100% de sucesso no caso do experimento I, teríamos como concorrentes as hipóteses de que a telepatia realmente funcionou e também a hipótese de que, simplesmente, o entrevistador está mentindo ou foi condicionado a pensar que o experimento funcionou por alguma peça que sua mente pregou em si própria.

Já no caso do experimetno II, com o papel escolhido disposto separadamente sobre a mesa para a observação de quantos quiserem observar os resultados, poderia ser sempre inconclusivo para provar a inexistência da telepatia nos casos de insucesso, devido a concorrência com explicações que apelam ao bloqueio mental por parte do entrevistador, porém forneceriam entusiasmantes argumentos em favor da existência da telepatia caso realmente os resultados desviassem sensivelmente das previsões estatísticas. A conclusão aqui é a de que este tipo de experimento, embora fosse capaz de provar a existência da telepatia, não seria capaz de provar sua inexistência caso seja este o fato. Assim, imaginando um mundo em que por séculos e séculos diversos cientistas se reúnem para desenvolver variantes deste processo, sem obtenção de sucesso, o que deveria ser admitido como resultado?

Fica em aberta a hipótese de fenômenos que se manifestam para os que acreditam. Supondo que não se trate de um caso de loucura, mas que realmente exista algo assim na natureza, algo que não se manifesta de forma uniforme a todos os seres mas que está, antes, condicionada pelo estado do sujeito, o que acontece com a ciência? Afinal, um dos pilares fundamentais da ciência, se não o principal absoluto, é a hipótese de que existem um conjunto homogêneo de leis por todo o universo, que regem de forma homogênea o comportamento de toda e qualquer partícula. Mas se algum ser consegue influenciar o colapso da função de onda, então para este indivíduo a distribuição de probabilidades do fenômeno final foi alterada. O que significa não só que a função de onda colapsou, mas que colapsou de forma controlada e que, portanto, implicaria em uma alteração mesmo de suas probabilidades, ao menos em termos empíricos (uma moeda tem 50% de chance de apresentar cada resultado, cara ou coroa. Porém se a experiência mostrasse uma moeda que, em mil lançamentos, apresentou novecentos resultados cara contra apenas cem resultados coroa, embora os cálculos teóricos implicassem em 50% de chance para a moeda, seríamos forçados a admitir que alguma coisa, mesmo que desconhecida, alterou a distribuição de probabilidades original). Esta observação final pode ser considerada como externa ao texto, pois é um arumento em contrário à explicação da telepatia pelo colapso de onda como algo coerente com a mecânica quântica atual.

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