Monday, February 27, 2006

A Rede e o Ser

Estou entrando em uma nova crise existencial com a engenharia, perguntando-me "o que diabos estou aprendendo nesse curso?". E o choque se deve ao contato com as páginas iniciais do enorme monumento de letras de Manuel Castells, "A Sociedade em Rede", parte da trilogia "A Era da Informação: Economia, Sociedade e Cultura". Não, não se desespere. Não vou abandonar ao curso e voltar à FFLCH, ou algo parecido. Afinal de contas, esse espantamento cheio de paixão eu estou acostumado a ter com as coisas mais distintas, e sei que o mesmo aconteceria (embora no sentido oposto) se eu estivesse hoje na FFLCH e me deparasse, por exemplo, com o detalhamento de projeto de um grande navio. Feita essa observação fundamental para tranquilizar o leitor, voltemos ao assunto.

"Este livro estuda o surgimento de uma nova estrutura social, manifestada sob várias formas conforme a diversidade de culturas e instituições em todo o planeta." - O que poderia ser mais instigante? E, pelo que vemos logo por meio do prólogo do livro, a abordagem de Castells é profundíssima, graças à sua vasta cultura acadêmica.

Sim, discute-se tecnologia e a forma pela qual a tecnologia influi nas relações sociais e molda a sociedade, mas não se cai nessa armadilha de tomar o "molda a sociedade" como uma via de mão única, determinística e completamente fatalista.

Sim, a sociedade molda a tecnologia, mas Castells não é da pobre tradição dos escritores que cultuam a Cultura como a Deusa suprema que está acima de todas as coisas, regendo-se sob leis próprias e ditando todo o suceder do que está abaixo.

Sim, a tecnologia é fundamental e o Estado tem um papel importantíssimo sobre o desenrolar do desenvolvimento cultural que é substrato do caminhar tecnológico. Mas embora isso mostre-se um belo rascunho teórico merecedor de ser discutido e contraposto a várias correntes de pensadores, Castells logo ao início toma o cuidado de advertir que sua obra não é "um livro sobre livros". Não se limitando ao terreno teórico ao mesmo tempo em que, definitivamente, não é um simples relator de fatos, Castells busca lógica não na tela branca sobre a qual construímos teorias, mas em meio ao caótico caleidoscópio instável da história. Dizer que o Estado sustenta o desenvolvimento tecnológico é de uma limpeza teórica total. Mas olhar a história obriga a admitir que uma mesma nação que serviria de exemplo de verdade a essa afirmação, em um dado momento serivá de contra-exemplo. Apenas para, anos mais tarde, voltar a ser exemplo. Falamos do Japão, cuja gangorra tecnológica é brevemente discutida no prólogo de Castells.

Os livros foram caros, é verdade. Mas já percebi que não me arrependerei de nem um centavo.

Para quem quiser maiores informações:

Home Page de Manuel Castells: http://sociology.berkeley.edu/faculty/castells/

Manuel Castells na grande Wikipedia: http://en.wikipedia.org/wiki/Manuel_Castells

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