Saturday, May 09, 2009
Tortuoso caminho entre as montanhas
Como o cérebro de humanóides primitivos foi aumentando de tamanho ao longo do tempo geológico até chegar ao design do homem moderno? Para responder esta interessante questão Sergey Gavrilets e Aaron Vose, da Universidade do Tennessee, adotaram a abordagem da simulação computacional. Nada melhor do que simular uma população de 50 a 150 indivíduos (tamanho compatível com grupos de hominídeos do passado, até onde sabemos). A simulação que os dois fizeram leva em conta evolução genética (orientando, primordialmente, o tamanho e a capacidade cerebral), bem como a evolução memética (evolução cultural de um conjunto de idéias, que é limitada pela capacidade cerebral).
Uma das observações interessantes do estudo é que num primeiro momento qualquer aumento da capacidade cerebral em humanóides primitivos é anti adaptativo! Isso porque uma capacidade cerebral maior justifica-se apenas na eventual ocorrência de memes vantajosos, mas não há a menor razão para supor que o sumples surgimento de um cérebro como uma capacidade marginal melhorada implicará na ocorrência de algum meme benéfico. Somos assim confrontados com um fato da natureza: a evolução não opera jamais sobre um ótimo local. Os pontos em que as populações são evolutivamente estáveis apresentam sempre uma distribuição em torno do ótimo. Ou seja, inicialmente, os humanos com cérebros maiores tratavam-se de um distanciamento do ótimo evolutivo, não de uma marcha em direção a ele, e foi só por conta de um outro evento completamente inesperado e imprevisível (a ocorrência de memes vantajosos) que cérebros maiores mostraram-se uma vantagem adaptativa.
É preciso ter em mente que esta é uma explicação por demais simplificada. Não faz sentido pensar em cérebros maiores como "computadores mais potentes" a espera de softwares melhores para executar. No mundo real, cérebros maiores poderiam conferir vantagens aos "softwares" já implementados em nossa mente, principalmente aos relacionados com o convívio social e memória (onde foram vistos predadores, onde foi encontrada água da última vez, etc).
De qualquer modo, por simplificado que seja, o artigo de Gravilets e Vose mostra que o surgimento de cérebros avantajados no Homo sapiens representa um processo de migração de um "máximo evolutivo", um ponto em que um design ótimo, por assim dizer, encontra-se estabelecido, para um outro ponto completamente distinto onde uma estratégia diferente passa a ser predominante.
Um outro ponto que serve de interessantíssimo ponto de partida para discussões sobre nossa sociedade atual:
However, the complexity of memes present in the population does not increase but, on the contrary, decreases in time (data not shown). This happens as a result of intense competition among memes: whereas complex memes give advantage to individuals on a longer (biological) time scale, they lose competition to simpler memes on a shorter (social) time scale.
Saindo do modelo simplificado e pensando no nosso mundo, as questões são: até onde a cultura geral da sociedade pode evoluir? Há limites para o quanto é possível difundir um bom sistema educacional? Nossa evolução científica e cultural estaria condenada a algum regresso incontornável após atingir algum "máximo" num determinado momento? Ou continuaria a cultura da sociedade como um todo a evoluir porém com a cultura dos indivíduos, tomados um a um, tendendo a regredir? Ou seja, nossas "forças cognitivas" passariam a se alojar cada vez mais nas estruturas institucionais e cada vez menos nas habilidades individuais de determinados experts? O artigo não faz esse salto analítico, que é meramente filosófico, especulativo, e muito difícil de ser abordado quantitativamente. Mas que são questões interessantes, isso são!
Outros grifos do artigo:
The negative effect of the number of loci L on the characteristics of cognitive abilities is explained by the fact that more loci means weaker selection on each individual locus and, thus, weaker evolutionary response. - Talvez esse efeito seja facilmente verificável nos algoritmos de projeto genético que estou habituado a utilizar para projetos de Navios ou Aviões. É uma justificativa para manter o número de parâmetros de projetos tão pequeno quanto possível, a fim de acelerar a convergência à solução final.
[...] throughout most of human history, success in social competition translated into reproductive success with the most powerful men enjoying a disproportionate share of women and offspring [...] [A]s the extent to which social success translates into reproductive success declines in modern societies, cognitive abilities are expected to be significantly reduced by natural selection. We also expect that as the number of memes in the population dramatically increases, learning ability will decrease further (because given a sufficiently large exposure to memes, they will be learned even by individuals with relatively low learning abilities) - Penso imediatamente na Luciana Gimenez, o que talvez implique que esse processo já vem se desenrolando há algum tempo...
Quem quiser ver o artigo no PNAS, é só clicar aqui.
Subscribe to:
Post Comments (Atom)
1 comment:
Cara, essa consideração final não lembra só a Luciana Gimenez... Lembra também, no mínimo, George Bush, Lula, e tantos tantos outros, não é?
Post a Comment