Monday, May 30, 2011
Até onde vão as inspirações?
Num ótimo livro de história da ciência:
"Assim como as leis do movimento foram invocadas para explicar tudo, desde política a moralidade, também a lei da gravitação universal foi arrastada à política, à biologia e à química. O cientista do Iluminismo, Maupertius, que publicou em 1732 o primeiro texto francês a explicar acuradamente a teoria de Newton, arriscou que a lei da gravidade poderia ter um paralelo no funcionamento de organismos vivos. David Hume falou da associação de idéias em termos newtonianos. Houve aqueles que compararam um rei e seus cortesãos e conselheiros ao Sol e seus planetas, sendo mantidos juntos por uma força atrativa. Estas tentativas de incorporar grandes desenvolvimentos científicos a outros campos hoje parece ridículo, mas o mesmo fenômeno iria repetir-se com Darwin e Einstein." (A Escalada da Ciência, Brian L. Silver)
Quase mudando de assunto, vamos ver um pouco sobre a evolução do cérebro, e depois faço meu comentário. Segundo Steven Mithen, professor de Arqueologia, pode-se considerar hoje que a formação da mente moderna se deu em três fases:
Fase 1: Mentes regidas por um domínio de inteligêcia geral - uma série de regras sobre aprendizado geral e tomadas de decisão. (Ou seja, algo que pode-se esperar mesmo em organismos simples. Um único "módulo" dedicado a tentar interagir com o mundo da melhor forma possível seguindo um pacote relativamente simples de regras.
Fase 2: Mentes onde a inteligência geral foi suplementada por várias inteligências especializadas, cada uma devotada a um domínio específico do comportamento e funcionando isoladamente. (Traduzindo: há uma parte do cérebro dedicada a atividades manuais. Há outra parte dedicada a produzir e reconhecer sons. Há outra parte dedicada a administrar as relações sociais no grupo. Estas partes cerebrais não se conversam ou sua inter-colaboração é muito precária)
Fase 3: Mentes onde as múltiplas inteligências especializadas parecem trabalhar juntas, havendo um fluxo de conhecimento e de idéias entre os domínios comportamentais. Em português claro, porém não necessariamente seguindo novas (ou velhas!) normas gramaticais: o processamento de informações na área dedicada a coordenação motora pode ter influência sobre a área de raciocinio lógico. O processamento de sons de repente pode influenciar o trabalho manual. Enfim... áreas internas diferentes do cérebro passam a interatir. Em particular, pensamentos em torno de um determinado assunto poderão livremente inspirar outros assuntos aparentemente não-correlatos.
Agora sim já dá para misturar as duas coisas... Brian Silver fica um pouco indignado com essa atitude de extrapolação despudorada de conceitos, porém essa é uma constante no intelecto humano. Pode até ser argumentado que é o que torna capaz o intelecto humano, para início de conversa. O que são os números se não o veículo mágico que permite ao pensamento lógico navegar livremente (sem culpa e sem impostos!) dentre os mais distintos domínios?
Há algo ainda mais interessante do que nossa tendência quase poética de extrapolar conceitos sem muitos rigores: a dinâmica de difusão e persistência dos conceitos criados por este processo. O mesmo processo de criação que origina tantas novas descobertas também origina os mais absurdos conceitos que, ainda assim, encontram seu nicho dentro da riquíssima culturosfera terrestre.
Ou então esse é só um pensamento bobo a que cheguei por caminhos pouco ortodoxos e condenáveis. Sei lá. ;)
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